17 de novembro de 2013

Domingo.



Me distraio em chuva fina
Vida na janela
Volto a ser menina

Lembrando de um tempo que eu era sol
Brincava de boneca
E cabaninha com lençol

Recrio minha vida em um segundo lento
Sentada no passado
Presente no momento

Onde está meu futuro incrível agora?
Na lembrança de um domingo?
No temporal que cai lá fora!

(Lara Gay)

26 de setembro de 2013

Quando eu era.


De tudo que me arrependo
Me arrependo mais de não te querer
Pois não te querendo deixei pra trás
Tudo que eu poderia ser.
Você me fazia ser sua deusa
Me fazia ser santa
Me fazia ser puta.
E de tanto me fazer ser
Eu cansei de me ser com você.
Me arrependo de não querer ser sua
Perdendo a parte que mais me era
Você
Que me era de noite e de dia
No riso e no pranto
No canto e, no entanto,
Meu peito te nega.
Se eu ainda fosse sua
Eu teria pra mim a parte que me perdi
Seria sua dama no lixo e na cama
Seu caso acabado
Que eu jamais permiti.
Me arrependo sem culpa
De agora me querer
E querendo reviver
Encaro a verdade:
Que sou uma metade!
Você é minha vaidade
E eu não me sou sem você.

(Lara Gay)


17 de maio de 2013

E se...


"E se não tivéssemos terminado?", ela pensou ao passar de ônibus pelo ponto da casa dele.
Vez ou outra aquela pergunta martirizava a menina de cabelos curtos que jamais encontraria sua resposta. E se...?
Mas hoje era diferente. Era noite de 24 de dezembro! Ela estava de peito aberto, num ônibus a caminho da casa da avó, cheia de sacolas de presente, um peru de Natal embrulhado no colo, e um desejo imenso de descer ali e tocar a campainha.
“E se nos olhássemos uma última vez? Não, não, melhor não. Está tudo bem como está... Não! Não está bem! Não estou bem! E se eu cometi um engano? E se era pra ser? E se eu fosse até lá?” Ela precisava de respostas.
Quando deu por si já estava na porta dele. Parada. Em pé. Carregada de sacolas e desejos. Dedo na campainha.

- Oi.
- Oi! Você...
-  ... Eu tava passando. Desculpa aparecer assim sem avisar... É... Feliz Natal.
- Pra você também.

E ele permaneceu parado esperando o que quer que fosse. Assustado. Nervoso. Aparentemente de coração na mão.

- Tô indo pra casa da vovó.
- Ah! Manda beijo nela, sinto saudade.
- Também sinto! - ela respondeu de impulso.

Silêncio.

- Sabe, às vezes me pergunto o que seríamos se tivéssemos sido alguma coisa.
- Provavelmente já não seríamos nada – ele respondeu rapidamente.

Silêncio.

- É assim que você nos vê? – ela retrucou ferida.
- É assim que nos fizemos ser.
- E se tivéssemos feito diferente?
- Mas não fizemos.
- E se começássemos do zero?
- Não dá! Não existe isso.
- E se tivéssemos sido diferentes?
- Aí não teríamos sido nós.  E é exatamente o que fomos que nos faz tão importantes um para o outro.
- Mas é isso que fomos que nos fez terminar.
- E é isso também que nos fez nos amarmos.

Silêncio.

- E você não me ama mais? – ela perguntou.
- Mais do que tudo.
- Então, e se a gente voltasse?
- Não vai dar. Não quero que nos tornemos nada. Preciso de nosso tudo pra continuar sendo quem eu sou.

Silêncio.

- Eu te amo. – ela disse engasgada.
- Eu também te amo.

E lá estava ela, com suas sacolas e respostas esperando o próximo ônibus passar. Atrasada. A ceia já posta. A família esperando.
E se ela não tivesse descido do ônibus ?
 
(Lara Gay)
 

6 de maio de 2013

... (súplica)



Tenho te sentido tanto e em pranto
Que ao fechar os olhos me confirmo o quanto
Necessito te olhar num canto
Qualquer que se foi de nós

De um passado a não passar por amar
Imploro, que se me é proibido te tocar
Deixe-me apenas sonhar
Que ainda estamos a sós.

(Lara Gay)

16 de abril de 2013

Crescer dói.


Ninguém disse que seria fácil crescer.
Dói.
E não é só a dor emocional de se ver sozinha no mundo e ser responsável pela consequência do seu próximo passo não.
É uma dor física.
Dói a vista, a coluna, as pernas, o estômago, os seios.
Dói até o que não dói.
Você inventa dores.
Dói se olhar no espelho e ver que a pele de neném começa a ter rugas e que você arrancou o primeiro fio de cabelo branco. (Shhhhhhh!!! Ninguém viu!)
Dói a dificuldade de emagrecer apesar de todas as corridas e dietas e dói mais ainda esconder o chocolate favorito que você comia todo dia depois da escola.
A sua letra redonda já está cansada de ser perfeita e começa a fugir da linha... como você!
E pra fugir dessa dor de crescer você chora, surta, se acha feia, paga tratamento de celulite, estria, faz lipo, pinta o cabelo, põe botox, fica pobre e ... continua crescendo.
Você está com quase trinta anos e tem atitudes de dezoito, menina.
Você não percebe que já cresceu?!
Crescer é uma aceitação, não existe idade certa pra isso.
Quando se aceita essa dor ela passa a ser bonita, porque ela te faz melhor, te faz mulher.
E ser mulher é seduzir a si mesma.
É andar no salto alto mesmo com o peso da vivência nas costas e continuar elegante.
É maquiar as lágrimas pra se fazer bonita pro espelho.
É dançar sem música pra acompanhar o próprio ritmo.
A dor de crescer é vaidade, e toda vaidade em excesso se torna fútil.
Tenho me sentido fútil porque crescer ainda me dói.
Bem... mas pelo menos já aceitei a minha negação.
É um primeiro passo para ser melhor?
Para ser mulher?

(Lara Gay)

6 de março de 2013

Tudo Por um Popstar.


Assisti duas vezes ao musical “Tudo Por um Popstar”, inspirado no livro da maravilhosa Thalita Rebouças e com duas das maiores amigas que tenho na vida no elenco.

Na estreia meu coração palpitava de nervosismo por elas, eu suava frio por ser estreia e sabia o quanto aquele momento era importante na vida das minhas amigas. Cada pulsação delas era um pulsação minha e o medo de algum imprevisto me dominava por dominar as duas. Enfim, foi tudo lindo, mas não consegui me entregar à peça como deveria.

Fui assistir pela segunda vez tempos depois, dessa vez mais relaxada, afinal, o musical já virou um sucesso e as minhas amigas estão sendo muito elogiadas. Fui pra curtir, pra entrar na história, e acabei voltando à minha adolescência.

Eu já fiz tudo por um Popstar!

Voltei internamente ao Rock In Rio 2001, onde eu tinha 16 anos e fui porque era apaixonada pela boy band NSYNC.
Meu quarto era cheio de cartazes, eu tinha pastas completas com matérias dos meus ídolos, sabia todas as letras (mesmo não sabendo uma palavra de inglês), e pegava as coreografias na madrugada para me apresentar em shows de Cover (Sim, COVER). Sonhava noites e noites com eles e acordava chorando por não ser real, mas o sonho mais incrível eu nunca esqueci: Eu estava no play do meu prédio e o JC vinha conversar comigo (em Português, claro), dizendo que um amigão dele estava afim de mim, e apontava para o Justin que estava no balanço um pouco mais a frente da gente. O mais incrível é que eu e minha inocência de 16 anos não permitimos que Justin me beijasse tão fácil assim e, eu, com o coração na boca me fiz de difícil e disse para o JC que se o Justin quisesse mesmo ficar comigo era pra ele vir até mim e me pedir pessoalmente.

Hoje em dia dou gargalhadas eternas desse sonho!

Mas, voltando à realidade, lá estava eu, com roupa de malhar, tênis velho nos pés, cartazes e biscoitos na mochila, pegando ônibus da Tijuca para a Cidade do Rock com mais alguns amigos de infância umas 7 horas antes do show! Chegamos e, como qualquer carioca, fomos nos infiltrando até chegarmos à grade e, lá chegando, nos instalamos até a hora do show.

Éramos um grupo grande de amigos, e com o passar das horas o empurra-empurra foi aumentando e nos distanciamos da grade, mas nada e nem ninguém ia atrapalhar nosso objetivo. Então, eu e minha melhor amiga de infância decidimos nos perder de propósito para chegarmos mais perto.

Esperamos uma brecha de confusão e ...
- Ué, cadê Eliza e Lara, gente? – uma amiga berrou.
Olhamos em volta e já estava tudo cheio de gente novamente. Cochichamos felizes:
- Eliza, com certeza estamos muito na frente!! Vamos ver NSYNC de perto!! – eu comemorei.
- Eu sei, amiga. Tô nervosa. Me levanta pra ver se eu acho a galera lá atrás. – Eliza me respondeu.
No mesmo momento levantei minha amiga o máximo que pude e ela fez abinha com as mãos para enxergar mais longe por causa do sol.
- Não vejo nem sombra de ninguém, amiga. Estamos muito na frente!! – ela me contou com sorriso de orelha a orelha.
Dois segundos depois escutamos uma voz vindo de duas fileiras atrás da gente:
- Eliza, Lara!!! Estávamos procurando vocês, poxa... Que bom que achamos!!

¬¬

Sim, nossa grande saga de fugir tinha sido duas filas à frente e ainda respondemos com cara de idiota:
- Poxa, que bom que nos acharam, estávamos tensas.

Continuamos em grupo e ...
- Vai começar o NSYNC!!! Vai começar O NSYNC!!!

Começou!!
Lá estávamos nós vidradas, morrendo de sede e vontade de fazer xixi, mas muito, muito felizes por vermos as cabecinhas dos nossos ídolos no Palco Mundo.
Tentamos dançar as três primeiras músicas na esperança deles verem e nos chamarem no palco pra dançarmos com eles, mas, obviamente, fomos surradas pelos outros fãs que pediam espaço. Acabamos cedendo, mas 1,56m não ajudavam muito para vermos o topete do Chris, até que dois anjos mineiros imensos ofereceram seus ombros pra assistirmos ao show em cima deles. Topamos, claro, e nem precisamos saber os seus nomes, já tinham virado nossos melhores amigos.
- Eliza!! – eu berrei de cima do menino – Quero muito fazer xixi!!!
- Eu também, amiga! Mas segura! É o momento da nossa vida! – respondeu Eliza.
E nesse momento o Joey jogou seu lenço branco de enxugar o rosto e caiu exatamente nas mãos de um amigo nosso, na nossa frente!!

A emoção foi tanta que o xixi saiu. Sim, o xixi saiu bem em cima do anjo mineiro que estava cedendo seu ombro e sua força física para mim. Foi sem querer, gente, eu juro que foi!
Não contei nada pro menino, claro, e até hoje não sei se ele não sentiu, se fingiu que não sentiu ou se achou que era suor, sei lá... Me fiz de sonsa (e eu sabia muito bem me fazer de sonsa nessa idade).

Acabou o show e lá estávamos eu e Eliza com a cara roxa de tanto chorar, berrar e suar até que...
- Eliza, preciso te confessar uma coisa.
- O quê, Lara?
- Fiz xixi em cima do menino sem querer!
- Mentira!!!!!! Eu também!!!!!

oO

Que vergonha da gente, mas éramos as pessoas mais felizes do mundo porque, obviamente, roubamos o lenço branco do Joey que nosso amigo havia pegado, aparecemos no telão do Rock In Rio em cima dos mineiros e vimos os vultos do NSYNC no palco. (Sim, porque com a distância que estávamos é impossível dizer que vimos eles em si).

Voltamos às 6h dormindo no chão do ônibus 234, nossa roupa foi toda pro lixo, nosso tênis pra máquina de lavar e, como todos que foram ao RIR, tiramos melecas pretas do nariz no banho. (risos) Mas não importa, éramos as fãs mais felizes do mundo e ainda não acabaria aí, porque no dia seguinte passaríamos o dia todo em frente ao Hotel Intercontinental na esperança de vermos nossos ídolos pela janela do quarto... E vimos.

No final do musical “Tudo Por um Popstar” eu estava muito emocionada, arrepiada e chorava muito, porque concluí que é uma peça pra qualquer idade, é uma peça para quem viveu um amor assim, esse amor de fã que é um amor real e incondicional, esse amor desmedido que faz com que pessoas completamente distintas se juntem em prol de um mesmo alguém, esse amor que faz nascerem outros amores e que, esses novos amores, podem durar a vida inteira...
E quando eu for velhinha, estarei sentada numa cadeira de balanço contando aos meus netos tudo que eu fiz por um Popstar e, obviamente, a Eliza estará ao meu lado brigando comigo por eu contar do xixi, como eu sei que ela vai fazer ao ler esse texto.

(Lara Gay)





Está em Cartaz:
Teatro Imperator - Quintas às 19h
Teatro Clara Nunes - Terças às 20h / Sábados e Domingos às 16h

5 de fevereiro de 2013

Ps. Do latim metus.


Tenho sentido muitos medos, e isso me deixa com medo.

Quando eu era criança e subia no muro do meu condomínio, minha mãe dizia “desce daí, minha filha, você pode cair e se machucar!” Eu descia na hora. O medo que eu sentia me dominava tanto que eu acabava com ele em menos de um minuto. Resolvido.

Sentia pavor do escuro. Quando eu mudava de cômodo no apartamento durante a noite, eu corria pra acender uma luz, depois corria de volta pra apagar a outra, e por fim corria mais ainda pra sair da primeira escuridão e alcançar a luz que havia acendido. Ufa!! Dormia (e ainda durmo) com um abajur de lâmpada azul, afinal, o que de mal pode me acontecer se eu tenho um abajur aceso, não é?

Tinha muito tiroteio onde eu morava, e eu sentia tanto medo que eu me enrolava no lençol e me escondia no banheiro (agachada no chão, é claro, que nem nos filmes), acreditava que lá era mais seguro, lá o barulho era mais distante, lá tinha uma lâmpada pequenininha que ficava acesa o tempo inteiro, lá eu dormia coberta de medo e protegida de luz. No banheiro.

“Lara, vamos visitar sua tia!” dizia minha mãe feliz, e quando o carro estava chegando ao prédio da titia, eu fazia xixi nas calças só de saber que iríamos subir quase vinte andares. “Lanchinho na varanda!”, gritava a tia farofeira e feliz... Mas a Lara preferia lanchar na cozinha mesmo, muito mais seguro que ficar comendo olhando várias formiguinhas lá embaixo! “Ai não, tia, muito alto isso aqui, prefiro comer aqui dentro!”

É, sempre fui medrosa, e nunca tive vergonha de assumir isso, mas quando se é criança a gente sempre dá um jeito de se sentir protegida, de afugentar qualquer medo, de se refugiar no colo da mãe, do pai, da boneca...

Eu cresci e tô com medo.

Tenho sentido medo de não conseguir pagar as contas no final do mês.
Ps. Não tenho mais o meu porquinho azul de camurça pra me ajudar; ele já foi quebrado quando eu fiz 15 anos.

Tenho sentido medo de não assinar um contrato.
Ps. Aquele sonho de se sustentar fazendo o que eu amo já acordou faz tempo, e atuar como vendedora de loja no shopping não fazia parte do meu roteiro, mas como não posso mais postergar minha sobrevivência, tenho pensado em morrer um pouco.

Tenho sentido medo da solidão.
Ps. Meus pais já saíram de casa, os amigos já estão casando, os filhos já estão nascendo, minhas bonecas já foram doadas... Já sei! Vou plantar uma árvore!

Tenho sentido medo de perder a graça.
Ps. Sempre tive medo de palhaço, embora sempre tenha sido uma (em todos os sentidos da palavra), mas a vida tem sido tão amarga comigo que não tá sendo fácil rir no desespero (ou até mesmo rir do desespero!).

Tenho sentido medo de não ter mais coragem.
Ps. E isso é o que me dá mais medo.

(Lara Gay)

23 de janeiro de 2013

Uma intrusa com Caetano.


Pisou tímida naquele chão.
Observou o verde das paredes e os verdes pendurados na varanda.
Entrou cabisbaixa no quarto. Tirou os sapatos, a mochila e a máscara.
Ficou tudo no sofá solitário que observa constantemente a vida alheia pela janela.
Queria mesmo arrancar todos os medos enraizados por dentro. Jogar fora pensamentos e se despir por inteira. Sem amarras, sem receios, sem regras...
... mas preferiu tirar apenas o que já tinha tirado e voltar para a serenidade da sala.
Ao som da madrugada (e de Caetano), foi se acomodando no novo espaço aberto para ela. Se esticou no sofá, abriu a geladeira (sentindo uma vontade imensa de abrir seu peito também), conheceu a descarga (que se apresentou educadamente) e riu sem controle tantas vezes, misturando seu timbre com o dele (não o de Caetano), que até esqueceu qual era o motivo real da graça.
Seus corpos se encaixavam como num quebra-cabeça, um jogo de suor que escorria limpando saudade e deixando rastros, gemidos de prazer eram a música ambiente, línguas perdidas, bocas com sede, cheiros novos, frases esboçadas, ritmo, ritmo, ritmo... e o gozo final com a resposta em sorrisos.
Observou-o em silêncio encharcada de prazer... Ahhh... se ele soubesse como ela já conhece cada detalhe de seu rosto...
Teve vontade de pedir para que ele segurasse sua mão, mas teve medo... (do medo dele)... porque mais que segurar sua mão, ela precisava mesmo é que ele nunca a soltasse.
Se sentiu menos estrangeira nessa terra tão vizinha. Mesmo assim pôs a roupa. Precisava se proteger de tanta felicidade.
E ela sabia que ao sair pela porta voltaria a ser apenas ela e seu medo (o dele?).
(...)

(Lara Gay)