Sensação de câmera lenta.
Fixei naquele momento.
No sorriso largo dela que parecia querer engolir o mundo para alimentar o vazio que a preenchia.
O olhar tão penetrante enquanto gesticulava suas dores que fiquei hipnotizada por alguns segundos.
Perdi a história.
O cabelo preso com dois grampos formando o ar de menina travessa.
As tatuagens escapulindo pela blusa, pela saia, pela bota...
Era ela.
Como sempre foi.
Exatamente ela.
A mesma voz que me acalmava.
A mesma irmã de alma.
Era ela, iluminada como só ela é.
Fazia tanto tempo que eu não reparava em seus detalhes.
Tão linda e tão viva.
Me enchi de uma paz ao me perder naqueles segundos que me senti completa por estar ao seu lado.
Senti raiva de mim por ter perdido tanto tempo remoendo mágoas
Por não ter perdido outras histórias em outros momentos observando sua delicadeza
É tão bonito ver aquele lado humano da super heroína que não chora e não cai.
(Ela sempre foi minha super heroína, embora não saiba.)
Me deu uma solidão de ter vivido momentos sem aquele riso
De ter chorado sem molhar aquela borboleta
De não ter sido o colo que ela precisou quando se sentiu sozinha
Tive vontade de pegar na sua mão e pedir desculpas.
De dizer que a amo sem receio e sem medo de julgamentos.
Mas era ela ali.
E eu tive vergonha... de mim
Continuei na minha câmera lenta tentando retomar o rumo da conversa.
Dei um sorriso concordando com a cabeça sem saber o que ela falou e dei um gole no copo de água.
Era ela.
A mesma amiga de sempre.
(Lara Gay)